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Educação etnorracial, multiculturalismo e afronegrismo

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Anistia e geografia de Zumbi dos Palmares

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Noedi Monteiro

Zumbi vence a fúria branca. Desde os dias de Palmares, tem incomodado e inconformado os detentores do poder; desafiado a relação de domínio e colonização eurocêntrica, provocado a hierarquia e a hegemonia das relações etnicorraciais no Brasil, pondo por terra, o mecanismo de opressão, discriminação e exclusão.

Até mesmo, o Estado de Direito Brasileiro que o havia considerado um perseguido, renegado, elemento perigoso, um bandido, cuja cabeça estava a prêmio como inimigo público nº 1, foi vencido, de suas injustiças contra ele.

O ordenamento jurídico que o vilipendiou hoje o reconhece, reabilita e promove. De uma vergonha para o Estado, passa ser evidência e um orgulho nacional, num caso ímpar na história do país. Antecede Tiradentes 97 anos. A redenção histórica de Zumbi, começa em 20 de novembro de 1971 com Oliveira Silveira (1941-2009) e o Grupo Palmares, em Porto Alegre – RS, num ato comemorativo, transformado em Dia da Consciência Negra, que teve de ser aprovado pela Turma de Censura e Diversões Públicas/DR/RS, da Polícia Federal, dois dias antes do evento, assinado pelo censor Otto Dias Machado Filho. Zumbi prospera como ícone do movimento negro e símbolo da igualdade racial e civil no Brasil, em pleno regime militar, perante o AI-5 (Ato Institucional) de 1968, a Lei de Segurança Nacional (LSN – decreto-Lei 898) de 1969, que em seu art. 39, inciso 6º, promete prisão à incitação ao ódio ou discriminação racial e enquadra o racismo como crime de segurança nacional. Zumbi, uma ameaça subversiva? Ou, uma revolução silenciosa?

Por que os heróis e heroínas de nossas epopéias, os protagonistas para contarmos e reproduzirmos para nossas crianças e jovens necessariamente são brancos?

Oliveira Silveira remete o guerreiro negro a novos traços e caminhos inimagináveis em sua geografia. Zumbi, que não havia suscitado mais do que 30 mil correligionários em Palmares, congrega hoje um enorme contingente que cresce dia a dia, de correligionários a meros simpatizantes. Desmistifica a ideia colonialista e perversa, de que “negro bom é negro morto” ou o “negro vale mais morto do que vivo”.

Conhecido, na época apenas regionalmente em Alagoas, Pernambuco, Zona da Mata e Mata Atlântica, nos dias que se seguem altera os contornos e a própria configuração icônica, para estabelecer seu novo domínio e soberania. Instruído na língua portuguesa, no latim, em humanidades e religião tem revolucionado o mundo acadêmico e intelectual. Nunca escreveu um só poema, mas sua vida se transforma em verso e versos. Nem escreveu um só livro, mas sua saga, tem rendido milhões de páginas, livros, trabalhos, monografias, dissertações, teses, palestras, encontros. Nunca escreveu uma única canção, mas vira ritmo, cântico e melodia; filme, peças e esculturas. Zumbi é um pódio; um topo; uma tendência nacional, para a loucura dos eugenistas e racistas de plantão. Hitler negou-se a condecorar o negro americano Jesse Owens (1913-1980) medalhista de ouro nas Olimpíadas de Berlim, Alemanha, em 1936, que também, não foi recebido pelo presidente Franklin D. Rooselvet (1882-1945).

Zumbi estava relegado à clandestinidade e sabotado pelo sistema dominante. Era, portanto, o nó na garganta dos afrodescendentes e o calcanhar de Aquiles do Estado.

A anistia e geografia de Zumbi começam acanhadas, mas projetam-se de forma irreversível e categórica e confundem arianos, teutônicos, nórdicos, alpinos, mediterrâneos e caucasianos. De cabeça a prêmio e troféu do capitão sertanista André Furtado de Mendonça (1558-1611), a serviço de Domingos Jorge Velho (1614-1705), em 1695 Zumbi dos Palmares, é alçado a medalha e diploma de mérito, comenda (entre elas a Grã-Mestre instituída pelo Gabinete Civil do Estado de Alagoas), diploma honorário e troféu por câmaras de vereadores, assembleias legislativas e palácios de governo, em sessões solenes, além de semanas e estudos afins, mês, marchas e comemorações, e o FECONEZU (Festival Comunitário Negro Zumbi), desde 1978.

Transformado numa insígnia por ironia; pois a única que conheceu, foi a de xerife, ostentada pelo capitão Fernão Carrilo; Brás da Rocha Cardoso; Bartolomeu Bezerra; Joannes Blaer; Rodolfo Baro; Zenóbio Accioli de Vasconcelos; Antonio Jácome Bezerra; Matias Fernandes; Gonçalo Pereira da Costa; Estevão Gonçalves; André Rocha; sargento-mor Manoel Lopes Galvão, chefes de expedições contra Palmares.

Muitos vilões, que triunfaram contra índios e quilombos foram reconhecidos e são homenageados com denominações, como se houvessem sido bonzinhos, mocinhos, justiceiros e imortais, justificados pela extensa folha corrida de atrocidades e tomadas como relevantes serviços prestados à nação.

Assim, a mais célebre vítima desses algozes, Zumbi dos Palmares ressurge como fênix, sendo reconhecido como herói nacional, com direito de estar no Livro de Aço do Panteão dos Heróis da Pátria em Brasília – DF e passar a denominar bibliotecas; vias e logradouros públicos; escolas (estaduais e municipais); colégios; associação de pais e mestres (Londrina – PR); bairros; loteamentos; conjuntos residenciais; vilas; estrada (Carobinha em Campo Grande – RJ); rodovia (RJ-111 em Nova Iguaçu – RJ); comunidades; acampamentos do MST; aeroporto (internacional de Maceió – AL); espaços culturais (especialmente, o da Câmara dos Deputados em Brasília – DF e a área do Pátio do Solar dos Câmara da Assembléia Legislativa – RS); fundações; institutos; universidade (Unipalmares); banca de jornais e revistas no centro de Maceió – AL, em toda parte.

Homenagens a Zumbi dos Palmares também estão representadas apenas como Zumbi (vias públicas; uma praia em Natal – RN; condomínio no Recife – PE; e bairros); Palmares (vias públicas; comenda; ordem do mérito; fundação cultural do governo federal; palácio do governo de Alagoas; municípios: AL, RS, PE); Dia da Consciência Negra (municipal e estadual: RS, MG, SP, CE, PR, RJ, MT); Dia Nacional Brasileiro da Consciência Negra (lei federal nº 9.125/1995); Dia Nacional da Consciência Negra (lei federal nº 10.639, que altera o artigo 79-B da lei 9.394/1996 – a LDB); pontos facultativos; e feriado de 20 de novembro.

Zumbi sai da agenda do Estado para entrar no calendário permanente e como  marco cívico de alta significação para o segmento étnico e composição nacional, no cumprimento do dispositivo § 2º do art. 215 da Constituição Federal.  Sai das entrelinhas para ser contexto. Granjeia monumentos, memoriais e bustos espalhados por todo o Brasil, destronando a princesa regente Isabel, desbancando Domingos Jorge Velho (substituído numa escola por um memorial de Zumbi em Teresina – PI) e Caxias. Estes são alguns exemplos da radical mudança ocorrida com a imagem de Zumbi, a válvula de escape e a mola-mestra dos movimentos sociais negros contemporâneos. A pedra angular e o ponto de contato de um conjunto de ações, que visam às mudanças políticas e sociais, nas relações étnicas e raciais brasileiras.

Zumbi conjuga em tempos diferentes os mesmos princípios: foi abatido por ser exemplo para os negros e pelo mesmo motivo, está sendo exaltado.

Written by Noedi Monteiro

novembro 18, 2009 at 7:42 pm

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Enfim, é dia de Zumbi, Luther King e Barack Obama

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A implantação do feriado de 20 de novembro no Brasil, Dia da Consciência Negra, que homenageia o herói negro Zumbi dos Palmares (1630-1695), esbarra mais do que na farsa de se esconder atrás do poder econômico e não respeitar a data, na fúria branca de não se render a um negro; num país de tremenda relação de dominação e poder, heranças do cativeiro, e na tamanha distância nas relações etnicorraciais

O sociólogo Oracy Nogueira (1917-1996) distinguia o racismo brasileiro em sendo de “marca” aquele safado, cordial, sorrateiro, disfarçado, do de “origem” dos EUA, onde todos conhecem o procedimento e é direto.

Logo após o assassinato de Martin Luther King Jr. (1929-1968), líder do movimento pelos direitos civis nos EUA, o congressista democrata John Conyers protocola projeto de lei na Câmara dos Representantes requerendo feriado nacional a Luther King. Os trâmites nos comitês do Congresso só começariam em 1979, assim ainda, por empenho pessoal do presidente Jimmy Carter, democrata.

Wilson Simonal (1939-2000) rende tributo a Luther King em 1966, numa canção em parceria com Ronald Bôscoli. Dick Holler nos EUA em 1968 rende tributo a Abraham (1809-1865), Martin e John (1917-1963), ativistas pelos direitos civis, numa canção consagrada por Dion Francis DiMucci.

O Brasil curtia a onda black power de Stockey Carmichael (1941-1998), os Panteras Negras de Angela Davis, Percy Huey Newton (1942-1989), Eldrigde Cleaver (1935-1998) e Mumia Abu-Jamal; o rap; o soul; o funk; o blue;  e as “bolachas” (discos) da gravadora Motown. Eclodiam os movimentos sociais alternativos entre eles o movimento negro, teorizado por Adorno (1903-1969), Habermas, Giles Deleuze (1925-1995) e principalmente Michel Foucault (1926-1984), autor de Genealogía Del Racismo de 1976.

Ainda em 1968 era eleita a primeira negra para a Câmara dos Representantes (1969-1983) pelo 12º Distrito de Nova York, Shirley Chrisholm (1924-2005). Educadora e a primeira mulher a concorrer à presidência dos EUA em 23 de janeiro de 1972 ficando nas prévias da Convenção Nacional Democrata, como a quarta pré-candidata mais votada.

Enquanto isso, Illinois, que teve Barack Obama como senador estadual (1997-2004) e como representante no Senado dos EUA [2005-2011 mandato renunciado] em 1973, torna-se o primeiro Estado a criar o feriado, seguido por New Jersey, Massachusetts – o primeiro Estado a abolir a escravidão (1780) – e Connecticut. O Estado do Arizona patina em várias tentativas (1975/76, 1981/82, 1986) para estabelecer o feriado, mas é barrado pela fúria branca. Institui somente em 1990. Montana institui o feriado, mas o anula em 1978. Definitivo em 2003.

Finalmente o projeto de Conyers é apreciado em 27 de março de 1979 pela Comissão de Justiça do Senado e da Câmara, pela Comissão dos Correios e Função Pública e pela Subcomissão de Estatísticas e Censos; mas foi derrotado por 6 a 0. Dick Cheney, o vice de Bush (2000-2008), está entre os votos contrários.

O senador branco James Strom Thurmond (1902-2003) quis alterar o feriado para Dia Nacional de Reconhecimento. Steve Wonder em 1980 com o advento da canção “Feliz Aniversário” que homenageia Luther King; e em 1981 no Rally Pela Paz colhe 6 milhões de assinaturas pelo feriado.

Com a ida de Katie Beatrice Hall (1982-1985) pela Indiana à Câmara dos Representantes, a luta pelo feriado encontra seu caminho. A resolução HR 3706/1983, de sua autoria e aprovada pelo Congresso, é transformada na lei nº 98-144, de 2 de novembro de 1983, assinada pelo presidente [1981-1989] Ronald Reagan (1911-2004), instituindo a terceira segunda-feira de janeiro como feriado nacional e civil dedicado a Luther King Jr., o “King Day”. Comemorado pela primeira vez em 20 de janeiro de 1986 por penas 17 Estados. Em 1989, outros 27 estados passam a comemorá-lo elevando o número para 44. A partir de 2000, todos os Estados passam a comemora a data. A festa cívica e etnicorracial estadunidense é nacional.

Os mórmons que até 1978 não aceitam batizar negro no Sacerdócio de Melquisedeque por considerá-lo descendente de Caim/Cão, portanto, um maldito e degenerado; em Utah chamam o King Day, de Dia dos Direitos Humanos. Em New Hampshire, o feriado foi chamado de Dia dos Direitos Civis. A Virgínia estado confederado conjuga o feriado Lee-Jackson ao King Day aproveitando para lembrar de seus generais sulistas da guerra da secessão (1861-1865) Robert Edward Lee (1807-1870) e Thomas Jonathan Jackson (1824-1863). Enfim, todos os Estados se rendem imparcialmente ao King Day a partir de 2000.

No Brasil, Zumbi é tornado ícone de nossa história em Porto Alegre – RS em 1971, pelo Grupo Palmares de Oliveira Silveira (1941-2009) e transformado no Dia da Consciência Negra em 7 de julho de 1978 pelo Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCDR) em São Paulo; oficializado como Dia Nacional Brasileiro da Consciência Negra pela lei federal nº 9.125/1995; instituído Dia Nacional da Consciência Negra no calendário escolar pela lei nº 10.639/2003, que altera o artigo 79-B da lei nº 9.394/96 (LDB). Zumbi é reconhecido herói nacional pela lei nº 9.315/1996. Assim, 20 de novembro que data sua morte torna-se feriado no Rio de Janeiro pela transformação na lei nº 2.307/1995, do projeto de lei nº 2.080/1992 do vereador Edson Santos atual Ministro de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR).

As comemorações se transformam em apenas expectativa e ansiedade. O caso foi parar nas barras dos tribunais. No STF (Supremo Tribunal Federal), tendo como relator do processo o ministro Marco Aurélio em 29 de junho de 200o, Zumbi é defendido e sua grandeza reconhecida, depois de 300 anos de sua condenação e execução sumária pelo estado opressor. O feriado é validado podendo ser instituído pelas câmara municipais com base no art. 358, incisos I e II da Constituição Federal/1988 que assegura, conforme reconhecimento, o direito de legislar sobre assunto de interesse local. Com voto confirmado pelos pares é extinto o processo sem apreciação do mérito.

A deputada estadual Cida Diogo por meio do projeto de lei nº 2.721/2001 transformado na lei nº 4.007/2002 pela governadora Bendita da Silva, estende o feriado para o Estado todo. Assim começa a peregrinação de 20 de novembro pelo Brasil.

No Equador, a partir de 1º de outubro de 1960, comemora-se o Dia do Negro. Em 10 de outubro de 1997 pela resolução R-035-97 da Sala de Sessões do Congresso Nacional, Cidade de San Francisco de Quito, Distrito Metropolitano, institui-se o Dia Nacional do Negro que homenageia o herói conforme o artigo 2º Alonso de Illescas (1528-1585), líder da República de Zambos de Esmeraldas, que resiste bravamente aos espanhóis. No artigo 3º da resolução equatoriana está indicado que estudo sobre Alonso de Illescas deve estar inserido no currículo da história nacional, para o reconhecimento das novas gerações.

É lembrado no Panamá em 30 de maio, o Dia Carlos Antônio Mendoza (1856-1916), primeiro presidente negro do país que exerce o mandato de 1º de março a 3 de setembro de 1910, e reconhecido como pai da independência panamenha. A Colômbia designa 5 de janeiro como o Dia do Negro e o dia 6, do Branco, na festa popular do Carnaval.

Líderes afro-latino-americanos: Yanga (1564-1612) no México; Domingo (Benkos) Bioho (séc. XVII) na Colômbia; Rey Negro Bayano (séc. XVI) no Panamá; Toussaint L´Ouverture (1743-1803) e François Makandal (séc. XVI) no Haiti; Francisco Congo (séc. XVII) no Peru; Andresote, apelido de Juan Andrés Lópes Del Rosario (séc. XIV) e Rei Miguel e sua mulher Reina Guimar (séc. XVI) na Venezuela.

Restam o Dia de Barack Hussein Obama, primeiro presidente negro dos EUA, eleito, em 4 de novembro de 2008, e o Dia Nelson Mandela.

[Texto atualizado, mas que inicialmente foi publicado no Jornal de Piracicaba, de 20 de Novembro de 2008 – Opinião – 3]

Written by Noedi Monteiro

outubro 4, 2009 at 9:24 pm

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Vigário-geral do Brasil: um negro

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NOEDI MONTEIRO

Havemos de imaginar 50 anos atrás, um bispo católico negro? E há 100 anos? Quatrocentos? Furar o sistema e galgar tamanha expressão na hierarquia episcopal não seria exigir demais para um vocacionado negro?

O cristianismo foi introduzido no poderoso Reino do Congo na África por dominicanos portugueses em 1484, sendo o rei Nzinga a Nkuwu, batizado pelo Cônego João de Souza e seu auxiliar Frei Vicente dos Anjos, em 3 de maio de 1491, com o nome cristão de João I. Seu neto, Príncipe D. Henrique I (1459-1538), no entanto, viria a ser um prelado negro muito interessante, no contexto histórico-religioso.

A façanha de se tornar um cardeal negro na história da Igreja na África, com reflexo para o Brasil, rompendo as teias do preconceito europeu, dos estatutos de sangue e da intolerância, foi realizada por D. Henrique I, filho do rei de Congo Nzinga a Mbemba (1456-1545), titulado D. Afonso I (ou D. Afonso Ribeiro) que reina de 1509 a 1545. Henrique foi estudar em Portugal, no Convento de Santo Elói de Lisboa (ou Mosteiro de São João Evangelista) sob os auspícios de D. Manuel I (1469-1521), o Venturoso (1495 a 1521).

Retornou para casa, consagrado ao sacerdócio pelo Bispo de São Tomé e elevado ao episcopado por cédula consistorial, de 5 de maio de 1518, do papa Leão X (1513-1521) em Roma. Foi bispo de Útica, província africana proconsular e auxiliar da Diocese de Funchal, elevada à categoria de metropolitana e primaz, em 31 de janeiro de 1533. Henrique I governa como bispo a Igreja do Congo (1521-1531), localizada na capital Mbanza Kongo. O papa Leão X, expede em 12 de junho de 1518 o Breve “Exponi nobis” ordenando ao sacerdócio outros negros. Com a Bula “Providum Universalis” Leão X em 28 de abril de 1514 havia confirmado a Dom Manuel, os domínios eclesiásticos do reino (regime de padroado), sobre as terras conquistadas, incluindo o Brasil. A jurisdição da Diocese de Funchal (1514-1551) tendo por 1º Bispo (1514-1526) D. Diogo Pinheiro (1437-1526) e vigário-geral D. Henrique I abrangia o Brasil, o Oriente e a África Portuguesa. Antes de Funchal, o Brasil pertencia ao Vicariato de Tomar (1500-1514). O Brasil por cerca de anos, esteve sob a direção eclesiástica do príncipe congolês D. Henrique I. Sob Funchal, surgiram as primeiras paróquias brasileiras. A primeira leva oficial de escravos (originários da Guiné) só chegou ao Brasil com Martim Afonso de Souza (1490-1564), em São Vicente (SP), em 22 de janeiro de 1532 e não alcançou o episcopado do cardeal africano. Tampouco Henrique I, alcançou a criação da Diocese de Angola e do Congo, em 1596.

Um primo de Henrique I, D. Afonso Preto estudava no Convento de São Domingos de Lisboa, por volta de 1533. Nzinga a Mbemba, pai de Henrique I, incentivava outros parentes à educação religiosa. Anterior a Henrique I, antes mesmo da descoberta do Brasil, há relatos de dois jovens: um da Guiné e o outro do Senegal, de haverem sido educados, em seminários de Portugal. Outros bispos e teólogos africanos saíram desses seminários.

A passagem de Henrique I mostra um pouco da África primitiva, nos albores de sua civilização. A África do tempo dos Reinos, antes da chegada dos colonizadores europeus e da retirada de grande contingente do continente, para a execução do trabalho escravo em todo mundo. Essa África misteriosa começa agora a ser revisitada e reconhecida, com a sua inclusão histórica nos conteúdos dos livros escolares; nos currículos das escolas públicas e privadas, em cursos de formação de professores, em cursos de especialização, mestrado, doutorado, e nas práticas pedagógicas de diversidade cultural, com base nas diretrizes curriculares nacionais e específicas, para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, por força das leis federais 10.639/2003 e 11.645/2008 e da Resolução 1/2004 do Conselho Nacional de Educação. Esta é a África, com as características do pioneirismo, de haver sido, a primeira civilização universal, o berço da humanidade e do conhecimento, com os egípcios, e não a Europa, como aponta a historiografia eurocêntrica, oficial e racista.

Com a criação do bispado de Salvador (BA) em 1551, pelo papa Júlio III, o Brasil é separado do Funchal e assim, D. Pero Fernandes Sardinha (1496-1556) aparece como primeiro bispo (1552-1556) na história eclesiástica brasileira, omitindo-se a figura ímpar, do bispo negro D. Henrique I e suas relações episcopais com o Brasil. D. Agostinho Ribeiro (1560-1621), foi o primeiro bispo nascido no Brasil, natural de Salvador.

Written by Noedi Monteiro

setembro 25, 2009 at 8:10 pm

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